quarta-feira, 14 de março de 2012

Histórias do Disque-Denúncia

Os Três Sequestros - 1995
Ainda não eram sete horas da manhã quando Marcos Fernando Chiesa chegou ao Colégio São Sebastião, na Estrada do Galeão, 998, Ilha do Governador. Aluno da segunda série do segundo grau, 16 anos, Marcos estava num Fiorino dirigido pelo motorista da família. Era uma quarta-feira, 25 de outubro de 1995. O que se seguiu estaria nas manchetes do dia seguinte. Diante da escola cheia de alunos, o carro foi fechado por um Passat e um Monza, de onde saltaram homens armados de revólveres e pistolas. Aos berros, o grupo rendeu o motorista e voltou-se para o interior do carro. Filho do comerciante José Chiesa, dono de uma próspera rede de churrascarias, Marcos era o verdadeiro alvo da ação. Foi arrancado do Fiorino e obrigado a entrar num dos carros, que disparou em alta velocidade. Desapareceu sem deixar vestígios.

Menos de duas horas depois, do outro lado da cidade, o jovem Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira Filho seguia para o trabalho. Naquele horário, como de costume, o trânsito arrastava-se lentamente pelas ruas de Botafogo. Diante do shopping Rio Off Price (atual Plaza Shopping), na Rua General Severiano, Eduardo, 21 anos, foi surpreendido por oito homens armados de escopetas e metralhadoras. Vestindo coletes da polícia civil, frios e organizados, eles prontamente cercaram sua pick up Mitsubishi. “Perdeu, perdeu”, gritava um dos integrantes do bando. Sem que pudesse reagir, Duda foi levado pelos bandidos. Cinco dias antes, seu pai, o empresário Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, diretor do grupo Ipiranga, havia assumido a presidência da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro.

Os dois episódios caíram como bombas na cúpula da Segurança Pública, que, na véspera, anunciara com entusiasmo a redução nos índices de seqüestro. Mas um terceiro petardo ainda estava para ser lançado. No fim da tarde, a estudante Carolina Dias Leite treinava equitação na Sociedade Hípica Brasileira, na Lagoa. Antes das 18h, ensaiava sua ida para casa, quando foi rendida na porta do clube. Como as vítimas anteriores, Carolina não foi pega ao acaso. Quatro bandidos esperavam pela moça de 18 anos, corpo mignon, filha de Antônio Dias Leite Neto, empresário do ramo de TV a cabo, neta de Antônio Dias Leite Filho, ministro do governo Costa e Silva. “Foi um soco no estômago”, desabafou o então governador Marcello Alencar. Naquela noite, uma névoa de impotência e desânimo cobriu o Rio de Janeiro. Oficialmente, dez pessoas permaneciam em cativeiro. Dos pontos de ônibus às mesas dos restaurantes, o assunto era um só: o Rio parecia refém do crime organizado.

Passadas menos de 24 horas, uma ligação anônima para o Disque-Denúncia mudaria os rumos dessa história. No telefonema – um dos vinte sobre o caso – uma voz dizia que Carolina estava numa casa do conjunto habitacional Santa Maria, em Campo Grande. Por causa da localização, a informação foi transmitida via fax para o Regimento de Polícia Montada Enyr Cony, da Polícia Militar, que fica em Campo Grande. “Disque-Denúncia? Como é isso?”, estranhou o capitão Weber Guttemberg Collyer, hoje tenente-coronel. “A gente nem sabia direito o que era o serviço”. Apesar da desconfiança, o então capitão achou melhor checar a história e seguiu com um pelotão até o conjunto habitacional. “A denúncia era cheia de detalhes, estava tudo lá. Avistamos a casa, cercamos e arrombamos a porta. A menina estava sentada, vendo televisão, tranqüila. Não estava acorrentada nem amordaçada. Perto dela havia um homem cozinhando”, lembra o tenente-coronel. O bandido tinha um revólver 38 apoiado sobre a geladeira, mas não arriscou empunhar a arma. Aliviada, a moça foi conduzida até o regimento, onde pouco depois pousaria um helicóptero providenciado pela família para levá-la até a Divisão Anti-Seqüestro, no Leblon. “Agora está 2 a 1 para eles”, bradou o então chefe da Polícia Civil, Helio Luz. No dia seguinte, Carolina divulgou um bilhete falando sobre o seqüestro. Encerrava o texto comemorando a libertação e dizendo: “Eu gostaria de agradecer a todo mundo envolvido nesse evento todo, especialmente à pessoa desconhecida que entrou em contato com o Disque-Denúncia”.


Enquanto a família de Carolina comemorava, continuava o calvário dos Gouvêa Vieira(1) e dos Chiesa. Uma semana depois dos seqüestros, na tarde de 1º de novembro, o Regimento de Polícia Montada de Campo Grande recebia um novo fax do Disque-Denúncia. O relato número 89.11.95 dizia: “no Caminho do Vai e Vem, em Rio das Pedras, Campo Grande, sobe um morrinho. No início do morrinho existe um portão preto que dá para um sítio. Há muito movimento de carros estranhos no local e também existe uma pessoa seqüestrada no sítio. A polícia esteve no local, só que não entrou nesse sítio”. Comandante do Regimento, o coronel Gilberto Pereira pegou o fax, estranhou o endereço e correu até a mesa, onde agarrou-se a um guia de ruas. Revirou o livro de cima a baixo e nada. Cismado, ele entrou na sala do serviço reservado e reclamou que não conseguia encontrar o local. Foi quando um soldado, que descansava em um canto da sala, interrompeu o coronel. “Meu comandante, o caminho do Vai e Vem não é em Rio das Pedras. É em Rio da Prata. Eu conheço”. Pereira deu a ordem: “Veste paisano e vai lá com o Weber”. Weber era o mesmo policial que, seis dias antes, libertara Carolina do cativeiro. Naquele dia, estava ali por acaso. Deveria estar de folga, como previa a escala do Regimento, mas havia trocado com um colega, que precisava do dia livre. Era fim de tarde quando a equipe chegou ao lugar descrito na denúncia – uma região de sítios, com algumas poucas casas, quase todas de aparência muito simples. “Seguíamos de carro quando deu para perceber uma pessoa no alto do morro. Já achei estranho, mas, para não despertar suspeitas, não parei em frente ao tal sítio. Continuei e dei a volta. O problema é que a viatura que vinha atrás da gente parou assim que viu o sítio, com o portão preto. Aí, não era mais possível perder tempo. Deixamos os carros e entramos correndo. A casa ficava mais ao fundo, numa descida. Uma casa muito humilde”, conta o tenente-coronel Weber.

Os policiais se dividiram. Parte cercou a casa, parte arrombou a porta e entrou. A construção estava vazia, mas havia um único quarto com a porta trancada. Com o tornozelo ainda dolorido por causa de uma entorse, Weber pediu ao colega que metesse o pé na porta. O colega atendeu ao pedido, a porta veio abaixo e logo os policiais se surpreenderam com a cena. O quarto era escuro e úmido. Tinha aproximadamente 9 metros quadrados e um colchão de casal jogado sobre o chão vermelho. Deitado sobre ele, havia um rapaz encapuzado, amordaçado e com braços e pernas amarrados. Ao lado dele, restos de biscoitos e uma garrafa de refrigerante. “Falei para ele que éramos da Polícia. Ele abraçou, chorou, ficou muito emocionado. A gente sentiu que ele tinha sido maltratado”, diz Weber. O refém era Marcos Chiesa. Nos sete dias de calvário, saber-se-ia depois, ele passou por vários cativeiros, foi transportado na mala de um carro, machucou o pé numa das mudanças, dormiu preso a uma árvore numa gruta. Passou frio, sede, fome e pensou que fosse morrer. Libertado pelos policiais, Marcos foi levado ao Regimento de Polícia Montada, onde tomou banho e jantou ao lado da tropa. Depois, foi conduzido à Divisão Anti-Seqüestro, onde o pai e os irmãos esperavam por ele. Naquela noite, diante de um pelotão de repórteres, Marcos agradeceu e fez um apelo à população, pedindo que as pessoas continuassem a ligar para o Disque-Denúncia.


A voz anônima que levou a PM ao cativeiro de Marcos esforçara-se – e muito - para ajudar. Primeiro, ligou para o Disque-Denúncia informando a localização do cativeiro. Depois, acompanhou a movimentação de policiais da Divisão Anti-Seqüestro pela vizinhança. Como eles foram embora sem chegar à casa, o informante ligou novamente para o Disque-denúncia, desta vez com detalhes mais precisos. Durante todo o episódio, um cidadão, anônimo, monitorou, da janela, a ação de bandidos e policiais. E repassou tudo o que viu em suas ligações. Horas depois, ao lado do filho, José Chiesa desabafava aliviado: “Sem a denúncia acho que meu filho não teria sido encontrado”.

Os seqüestros de Marcos, Carolina e Eduardo desencadearam uma onda de indignação que uniu empresários e moradores de favelas, organizações-não-governamentais, políticos, artistas, sindicatos. Um amplo movimento pela paz, batizado de Reage Rio, ganhou as ruas da cidade. Enquanto isso, a central de atendimentos do Disque-Denúncia via o volume de telefonemas crescer 800% em quinze dias. Os seqüestros de outubro de 1995 foram a prova de fogo do Disque-Denúncia. “Foi quando pudemos provar a eficácia do sistema”, afirma Zeca Borges, coordenador do serviço. O combate ao crime no Rio de Janeiro ganhava uma nova arma. E desta vez ela estava nas mãos do cidadão.
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1 Várias denúncias falavam do suposto cativeiro de Eduardo. Nenhuma levou a polícia até ele. O rapaz viria a ser libertado, graças a investigações da Polícia Civil, na madrugada do dia 31 de novembro – mais de um mês depois do seqüestro, em Santa Cruz da Serra, Duque de Caxias. Eduardo estava acorrentado ao empresário José Zeno, seqüestrado quatro meses antes, na porta de sua casa, no Condomínio Novo Leblon, na Barra da Tijuca.

3 comentários:

Anônimo disse...

Todas essas pessoas que são sequestradas depois tem que se fazer muitos exames psicológicos e médicos, ir a centros de radiologia no rio de janeiro para ver se estão bem de saúde porque foram muito mal tratados.

Anônimo disse...

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Anônimo disse...

Tem que prender os melicianos do poraquê , pedra de Guaratuba , toda sema some gente na quele lugar , e ninguém faz nada !