domingo, 14 de outubro de 2012

Ocupação de Jacarezinho e Manguinhos: mais uma vitória da sociedade, da lei e da ordem


Milton Corrêa da Costa

A análise contextual que se faz, sobre a ocupação das Favelas do Jacarezinho e Manguinhos, pelas forças de segurança, inclusive com apoio das Forças Armadas, é que estamos diante de mais uma ação estratégica da atual política de segurança no processo de enfraquecimento do narcoterrorismo no Rio. É como estivéssemos numa guerra convencional e precisássemos avançar no terreno e tomar dois importantes pontos estratégicos do inimigo. A tomada, principalmente da Favela do Jacarezinho, é a mais importante vitória da política de segurança do Estado, após as tomadas e pacificação do Complexo do Alemão e da Rocinha. Até porque, com a anunciada futura instalação da Cidade da Policia (Civil) e do Comando de Unidades de Operações Especiais da Polícia Militar, nas proximidades da região do Jacarezinho e de Manguinhos, onde atuam traficantes da maior facção criminosa do Rio, seria ilógico o poder legal conviver com a ilegalidade muito próxima.

Com relação à Favela de Jacarezinho há que se considerar que a localidade, de extensão territorial  considerável, com cerca de 950 mil metros quadrados, com grande densidade demográfica (38 mil habitantes) e baixíssimo índice de desenvolvimento humano (IDH), possui inúmeras entradas e saídas para pontos da Zona Norte e Leopoldina. fatos que sempre dificultaram sobremodo as incursões policiais no local , sendo até então reduto de homízio de perigosos marginais da lei, de guarda de armas de guerra, drogas e veículos roubados, além de conhecido ponto de partida e chegada dos chamados "bondes do terror".

Jacarezinho é também considerado hoje o principal ponto de comércio e consumo de crack no Rio. Manguinhos, localidade não menos violenta, e também de baixo IDH, de extensa área territorial, é outro ponto estratégico tomado,neste final de semana, localizando-se entre a Avenida Brasil, uma das mais importantes vias expressas da cidade, rota de passagem de entrada e saída do Rio, e a Avenida do Democráticos, onde a Rua Leopoldo Bulhões, via principal que divide a citada favela, em razão dos episódios de violência ali ocorridos, é chamada de "Faixa de Gaza". As duas favelas somadas e muito próximas, Jacarezinho e  Manguinhos, possuem um área de cerca de 3,5 milhões de metros quadrados, com um total aproximado de 75 mil habitantes.

O fato é que fica mais uma vez evidenciado que não há recuo da política de segurança do Governo do Estado. No entanto, na política de ocupação de territórios, até então dominados pelo poder paralelo, projetos sociais e de urbanismo precisam vir a seu reboque. Não basta libertar cidadãos do terror e da opressão dos fuzis de guerra, é preciso também que o resgate da cidadania seja pleno. Se quisermos um dia vencer a Guerra do Rio é preciso prosseguir, obstinadamente, ocupando territórios inimigos. O preço da liberdade e a da paz social é a eterna vigilância. Ponto para a polícia do Rio na missão de defesa da lei e da ordem. Agora há no Rio um remédio atípico para uma criminalidade atípica, que liberta cidadãos do medo, da opressão e do terror. A vitória maior é da sociedade. Sem dúvida.

Milton Corrêa da Costa é tenente-coronel da reserva da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro 

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

UPPS: de minha parte, obrigado


Zeca Borges

Conta-se muito esta história sobre Elizabeth I da Inglaterra. A rainha e seu protegido, Sir Walter Raleigh, divertiam-se a fumar charutos - na segunda metade do século XVI, isto devia ser uma grande novidade, dentre outras vindas da América.
Observando a fumaça, Raleigh afirmou que ela poderia ser pesada. E, apanhando um charuto novo, iniciou sua demonstração. Colocou-o numa balança e anotou seu peso. Acendeu-o e começou a fumá-lo, tendo o cuidado de colocar suas cinzas no prato da balança. Quando terminou, colocou o que restava do charuto junto às cinzas, e verificou o peso. A diferença que faltava, afirmou ele, era o quanto a fumaça pesava. Brilhante.
A rainha ficou ainda mais encantada com seu favorito. Embora tenha sido interessante, o que aconteceu depois já não tem relação com o assunto que iremos abordar. A história fica por aqui.

Uma das maiores contribuições de iniciativas como a das UPPs no combate ao crime tem muito a ver com a fumaça de charutos. Pode-se dizer o mesmo do Disque Denúncia e das ações preventivas da polícia civil e do BOPE, e, especialmente, das atuais atividades de policiamento ostensivo realizadas pela PM.
O resultado não aparenta peso, embora ele exista. A maneira de se obter esse peso tem algo a ver com o que Sir Walter Raleigh demonstrou. Se na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, os casos de homicídio caíram de acordo com as informações do ISP, podemos afirmar que 160 pessoas deixaram de morrer entre Janeiro e Agosto de 2012. Estas 160 vidas foram poupadas no período. É o quanto pesa a fumaça.
Nunca se saberá quem foram os que escaparam. Conhecemos apenas os 886 que foram mortos, quem são e como foram chorados. Mas não houve comemoração na família dos que estão vivos. Como posso estar entre eles, de minha parte, muito obrigado.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

UPP da Rocinha: a vitória da sociedade contra o banditismo


Milton Corrêa da Costa


A instalação, nesta quinta- feira 20/09, da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, assim como foi a ocupação do Complexo do Alemão e suas cercanias, pela união da forças de segurança, no memorável 25 de novembro de 2010, é um marco histórico da política de segurança do Estado, num projeto vitorioso de pacificação de comunidades até então submetidas, durante longos anos, ao medo, ao terror e à opressão das  arrmas de guerra, onde infelizmente algumas ainda se encontram sob o domínio de narcoterroristas em favelas não pacificadas, apesar da dura e permanente repressão policial.

A Rocinha, considerada até então área de difícil tomada pelas forças legais, face as suas características peculiares de favela-bairro e região extremamente acidentada (66% de sua área está acima da cota de 100m), era considerada o 'quartel general’ do poder financeiro do narcotráfico no Rio, fato que lhe conferia relevante importância estratégica na estrutura do narcoterrorismo. Situada na Zona Sul do Rio Barra da Tijuca , entre os bairros da Gávea e São Conrado, considerada a maior favela da América Latina (850 mil metros quadrados e 70 mil habitantes), a Rocinha era o principal centro de refino da pasta básica de coca no Rio, na produção da cocaína e outros derivados como o oxi e o crack - vários laboratórios de refino ali foram encontrados- além de importante centro de comércio do ecstasy, uma droga sintética muito consumida por jovens de classe média e alta. Por sua localização estratégica, situada entre a Zona Sul do Rio, atendia consumidores de drogas de maior.poder aquisitivo, os verdadeiros financiadores da violência e dos fuzis do banditismo.



É sabido que UPP não é projeto social, poré  é a estratégia de ordem pública que faltava para proceder a invasão social e trazer o resgate da cidadania e a paz a moradores das localidades onde estão instaladas. Na Rocinha falta saneamento básico -o índice de tuberculose na região é considerado alto- falta coleta eficiente de lixo, faltam ainda projetos de urbanismo, mas tudo isso será possível agora equacionar. Obviamente que não se pode imaginar, num processo de tamanha transformação, que moradores do local se livrem rapidamente do medo e das represálias do tráfico. As sequelas do medo e a desconfiança de moradores ainda persistirão por algum tempo. Só o tempo dará àquela comunidade e a outras já pacificadas- jã são 28 UPPs instaldas no Rio- a crença definitiva no poder legal do Estado. Haverá sempre um tempo de adaptação no aperfeiçoamento das relações polícia/comunidade, onde o policial militar precisa ser visto pelo morador da localidade como parceiro e verdadeiro defensor da cidadania e não como um simples fiscal da lei ou opressor. 

Fica constatado  também, que a era do “mitos do tráfico”, como o bandido Nem que ali reinava, é finda na Rocinha. O império agora é do poder legal do Estado, não o do medo e do terror. A consolidação da UPP na Favela da Rocinha é, portanto, o mais duro golpe até hoje desferido na estrutura econômica do narcotráfico no Rio e uma vitória da sociedade contra o banditismo. A Unidade de Polícia Pacificadora, uma estratégia de polícia de proximidade, é um novo tipo de policiamento, sólido e permanente na área de segurança pública. Uma política de estado. Um remédio atípico e eficiente para uma criminalidade atípica e violenta como a do Rio. 

A implantação da UPP da Rocinha representa, pois, mais um marco divisor na história policial do Rio, uma quebra de paradigmas e sobretudo a vitória da lei e da ordem. Ao governador Sérgio Cabral, ao secretário José Mariano Beltrame, ao aparelho policial do estado e aos dois policiais militares, que durante o processo de pacificação da localidade tombaram mortalmente no cumprimento do dever, os aplausos de toda a sociedade.O preço da liberdade e da paz social é a eterna vigilância. O sonho da paz agora é real.


Milton Corrêa da Costa é tenente coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Ao contrário de um balão, uma denúncia não cai do céu.


Há muito soltar balões deixou de ser uma brincadeira inocente. Toda a beleza e criatividade propostas pelas pessoas envolvidas com esta prática não mais disfarçam os perigos encobertos pela alegria das cores e dos movimentos no céu. É bonito, sim, mas as luzes de um balão nas noites frias de inverno podem ser prenúncio de acidentes muito graves.

O Disque Denúncia recebeu no ano passado mais de quatrocentas denúncias sobre balões e baloeiros, sobre depósitos, locais de festivais e de comércio de artefatos para confecção e soltura de balões. Foram apreendidos balões de mais de quarenta metros de altura, que representavam ameaça às nossas florestas, refinarias e aeroportos.

O assunto é sério: balões atentam contra a vida, contra a propriedade, contra a natureza, ameaçando atividades econômicas e sociais, trazendo riscos de acidentes e de incêndios.

O Programa Disque Balão funciona desde 1999, promovendo campanhas de esclarecimento e oferecendo recompensas a informações que levem à apreensão de balões e de material para sua fabricação. Há também o pagamento de prêmios às equipes de policiais que obtenham sucesso ao investigar estas denúncias.

As recompensas vão de trezentos a dois mil reais, dependendo do estrago causado à festa.


terça-feira, 8 de maio de 2012

Duas violências e uma lógica

Khalil Dale era um voluntário da Cruz Vermelha. Foi assassinado no Paquistão e seu corpo (separado da cabeça, segundo uma fonte) foi deixado em um pomar.
Havia uma exigência de resgate que não foi atendida e ele foi executado aos 60 anos de idade. Foi encontrada uma nota justificando a execução pelo não pagamento do resgate. Ele tinha sido sequestrado por um grupo armado.
Por que o resgate não foi pago? Porque é uma política da Cruz Vermelha Internacional, que proporciona ajuda humanitária em muitos países onde houve e há sequestros de pessoas com pedidos de resgate. Os dados mostram que o pagamento de resgate não garante a vida nem o regresso do sequestrado. Khalil foi sequestrado e retirado de um veículo da Cruz Vermelha, em janeiro, em Quetta. Ficou esses meses em poder dos sequestradores.
Khalil vivia em Dumfries, na Escócia, e nasceu em York, segundo o Herald Scotland e no Yemen, segundo o Muslim Times. Tinha se convertido há um ano ao islamismo mas, a despeito disso, não foi poupado numa região separatista com forte atuação de islâmicos radicais.

Segundo a polícia local, os talibãs divulgaram nota assumindo a responsabilidade pelo crime.



Antes de ontem, na Tijuca, minha mulher foi vítima de outro tipo de sequestro, um arrastão de um edifício de apartamentos na Tijuca (e não em Vila Isabel, como foi noticiado). Perdeu o celular, dinheiro, relógio e uma relíquia, medalha da Virgem Maria que pertencera a minha mãe. Havia cerca de vinte reféns, inclusive crianças, e os cinco ou seis assaltantes trataram os reféns com brutalidade. Levaram um policial rodoviário como garantia. O preguiçoso repórter que cobria a área ficou na polícia, não entrevistou as vítimas e o jornal deu um show de incompetência. Errou, errou e errou.  
O que penso, nesse momento confuso, a respeito desses acontecimentos tão distantes no espaço e tão perto na animalidade? 
Há uma crise de valores, na qual a vida humana vale pouco ou nada. É a Lei de Gerson em escala mundial. A vida “dos outros” é trocada por bens materiais; é trocada por poder, é trocada por prazer. Há um consumerismo do espírito. A religião não é garantia de proteção e, às vezes, promove a violência nas Jihads iniciadas por religiões e culturas diferentes. Não é exclusividade de radicais islâmicos. 
O amor pelas pessoas deu lugar à adoração pelas coisas.  

GLÁUCIO SOARES             IESP/UERJ  

Fontes:
The Muslim Times, 4 de maio de 2012
Herald Scotland , 4 de maio de 2012 

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Anotações de como o Rio venceu o sequestro.

No final de 1997, foi sequestrada na Tijuca uma senhora de 74 anos, mulher do ex-presidente de uma grande multinacional. Um mês antes o Rio tinha estabelecido um plano de combate ao seqüestro, baseado num acurado diagnóstico. Era este seu primeiro grande teste.

A DAS iniciou suas investigações de acordo com as diretrizes programadas: além do uso de tecnologias avançadas de inteligência e de investigação, três objetivos principais deveriam ser atingidos para a operação ser considerada um sucesso: a vítima deveria ser libertada graças à ação da polícia; o resgate não poderia ser pago; e seqüestradores deveriam ser presos. O delegado Marcos Reimão não abria mão de qualquer destes princípios, tendo em vista que o objetivo final era livrar o Rio de Janeiro daquele tipo de crime.

Acontece que, nem bem iniciadas as investigações, entraram em cena executivos ingleses, de uma empresa especializada em negociar libertação de reféns para seguradoras internacionais. Logo ficou claro que havia uma diferença de objetivos entre os dois grupos. Foi percebido que aqueles estrangeiros gentis podiam estar ocultando dados, em favor de sua estratégia de levar os seqüestradores a libertar a vítima assim que possível. Reimão colocou - sem informar detalhes de sua qualificação - um delegado fluente em inglês acompanhando as negociações, que confirmou as suspeitas da equipe. O que os executivos estavam negociando com a família e a matriz, era diferente do que era relatado à DAS.

O mais grave, porém, é que o time da casa não conseguia avançar na identificação da quadrilha e na localização do cativeiro. Às vésperas da data limite estabelecida pela quadrilha para o recebimento do resgate, havia apenas frágeis suspeitas sobre a origem do grupo e seus métodos, além de alguma idéia sobre as áreas de que partiam as ligações para a família.

Na madrugada de 24 de dezembro de 1997 as equipes da DAS estavam preparadas para o acompanhamento da gincana que precede o pagamento do resgate. Naquela manhã os negociadores ingleses sairiam pela cidade, sob orientação dos criminosos, para percorrerem diversos pontos, recolhendo bilhetes e indicações, de modo a permitir que a ausência de polícia na operação fosse verificada. Pelo final da tarde determinariam o local da entrega do dinheiro.

A primeira decisão de risco foi tomada na véspera: distribuir equipes pelas áreas que eram indicadas como prováveis locais de chamada pelos negociadores da quadrilha, esperando a única oportunidade para prendê-los, que seria logo pela manhã, no contato que daria início à gincana. A distribuição foi precisa: quando a ligação ocorreu, o rastreamento indicou um local no Centro, há menos de 500 metros de uma das equipes. Ocorreu que, quando a equipe foi contatada, ainda não tinha chegado ao local, estava atrasada! E a oportunidade melhor calculada foi perdida, deixando a sensação de ouro em pó escorrendo entre os dedos.

As equipes tentaram manter algum ritmo, inutilmente. Eram seis horas da tarde, com quase todos os procedimentos da gincana completados, faltando pouco para o dinheiro seguir, e nenhuma prisão fora feita, nenhuma nova informação chegara. Como abortar o pagamento sem uma contrapartida que desse segurança à vítima? Quando dinheiro saiu, uma moto e um carro não ostensivo da DAS aguardavam defronte ao flat dos ingleses, que foram seguidos discretamente. A gincana estava em seus últimos passos. Mais um bilhete, e o pagamento seria feito.

Foi quando o destino aprontou outra. A equipe de Vila Valqueire obteve pistas seguras do local do cativeiro. As equipes todas foram direcionadas ao local. Mas havia um problema: não haveria tempo para libertar a vítima e, depois, abortar o pagamento. O que fazer? Estava em jogo uma vida. Seria muito mais fácil permitir o pagamento do resgate e libertar a senhora, se fosse o caso. Nenhuma carreira policial correria qualquer risco, apenas o plano de ação naufragaria, nada mais.

O agente inglês levou um susto, quando teve seu carro fechado. Acreditava serem os seqüestradores. Um delegado de polícia identificou-se e informou-o que, por determinação do delegado titular da DAS, o pagamento não poderia ser feito e convidou-o a ir até a Divisão com o dinheiro do resgate. Um motorista da polícia assumiu a direção do veículo e dirigiram-se ao Leblon.

O local do cativeiro foi cercado por mais de quarenta agentes. Era uma demonstração de força, para que os seqüestradores que lá estivessem se entregassem. Foi o que aconteceu. Eram dois homens e duas mulheres. Abriram as portas, apontando para as armas colocadas sobre uma mesa.

Eram nove e meia da noite, 24 de dezembro de 1997. A senhora estava algemada a uma cadeira, no canto de um quarto, assustada com o movimento. “Fique tranquila, eu sou o delegado Marcos Reimão, e estamos aqui para levá-la para casa.” Os olhos cansados brilharam. D. Ilka não foi para casa, mas passou aquela noite de Natal em uma clínica da Zona Sul do Rio, com seu marido.

O dinheiro foi devolvido à família.
A partir deste caso, nenhum seqüestro ocorrido no Rio de Janeiro resultou em pagamento de resgate.
Todas as vítimas foram libertadas pela polícia.
Mais de 200 envolvidos foram presos e processados em dois anos.
A equipe que atrasou foi removida da DAS.
No ano seguinte a empresa inglesa mudou seus escritórios para São Paulo.

sábado, 14 de abril de 2012

Para entender as guerras do Rio e de Niterói

Milton Corrêa da Costa
O fenômeno do aumento dos atos de violência em Niterói tem levantado, ultimamente, a discussão entre os estudiosos da violência urbana. Apesar de enfraquecido hoje, pelo distanciamento de seus principais líderes trancafiados fora do estado e de consideráveis perdas financeiras, em razão do projeto do novo modelo de polícia de proximidade, com a implantação das UPPs em comunidades até então consideradas importantes redutos do tráfico, e mesmo com a permanente e dura repressão policial, é preciso entender que o narcoterrorismo não sucumbiu em sua essência, apesar de sua visível desestruturação (momentânea) com a tomada do Complexo do Alemão, em novembro de 2010.

A doutrina narcoterrorista hoje atua de forma descentralizada, em redes, com migração para outras localidades e direcionamanto para outros tipos de delito (vejam o crescimento do roubo de veículos), fato que dificulta a repressão policial, tornando-se novamente atuante, na busca incessante dos lucros, finalidade precípua do crime.

Basta observarmos os recentes resultados de operações policiais, inclusive em localidades ocupadas (armas e drogas apreendidas e bandidos presos) e os atos de violência perpetrados por traficantes -- na madrugada de sexta-feira, 13 de abril, seis traficantes de uma facção rival foram presos pela PM ao tentarem invadir e tomar o Morro do Palácio, em Niterói.

Ações contínuas de guerrilha urbana, com o emprego do elemento surpresa, mostram ainda um contexto de extrema violência, agora com evidente direcionamento de sensação de insegurança e medo difuso para o entorno do Grande Rio, a exemplo de Niterói, onde a Secretaria de Segurança, para conter a febre do crime, reduzir o temor da população e infundir sensação de segurança, acaba de instalar duas bases da Polícia Militar e reforçar o efetivo policial do 12° BPM. É evidente que quanto mais polícia ostensiva menor oportunidade do cometimento de delitos. A questão é que a polícia não é onipresente e o cobertor do efetivo policial continua sendo curto.

O outro grande de entrave à ação policial é que até hoje, apesar de 20 anos da luta permanente contra o narcoterrorismo não se sabe ao certo quantos são os traficantes que circulam pelos morros e favelas de toda a Região Metropolitana e o qual o quantitativo (aproximado) do arsenal de guerra que se encontra em suas mãos.

Por sua vez, os recentes episódios no Morro da Mangueira e na Cidade de Deus, de 'ordem' do tráfico para fechamento do comércio local são tentativas claras e orquestradas de desacreditar o projeto das UPPs e demonstrar que o narcoterrorismo ainda exerce, através do medo e do terror, domínio sobre a população, resultado de longos anos de relação de dominação e opressão pelo terror das armas de guerra. São resquícios das "zonas de anomia" que predominavam no Rio. Uma cultura fortemente arraigada que envolverá considerável tempo para ser mudada. Tal tipo de resistência, com a intimidação a comerciantes, favorece inegavelmente a ação marginal gerando o medo e o silêncio entre moradores, dificultando a ação de inteligência da força pacificadora para obter informações objetivando o seu planejamento preventivo e repressivo.

Trata-se de estratégia narcoterrorista muita nítida, com base em pressão psicológica sobre os habitantes da localidade, cuja contra ofensiva da força legal, num período de adaptação de um novo e importante modelo de policiamento, deverá estar voltada principalmente para o fortalecimento da ação psicossocial, na relação de parceria com a máxima aproximação da população alvo, inclusive no desenvolvimento de ações cívico-sociais que angariem a confiança a simpatia de moradores. Ações de estado que mostrem as vantagens da ambiência de paz social.

O período ainda é de afirmação do projeto UPPs e de combate permanente aos focos de resistência visando a consolidação futura de um importantíssimo projeto de governo, como única estratégia de polícia capaz de enfraquecer um modelo de criminalidade atípica como a do Rio. A luta contra o narcoterroismo no Rio está apenas começando e a paz social e o resgate da cidadania, como finalidades precípuas, também apenas se iniciam. A vontade política, a ação de polícia proativa – a que se antecipa ao crime pelos dados da inteligência- e o permanente combate à corrupção policial serão estratégias fundamentais para a consecução dos objetivos. Disso não há dúvida. O preço da paz social é a eterna vigilância.
Milton Corrêada Costa é coronel da PM do Rio de Janeiro na reserva

quarta-feira, 28 de março de 2012

Millôr esculhamba o Disque-Denúncia - 1996

Corria o ano de 1996 e o Disque-Denúncia conseguia mobilizar a população do Rio de Janeiro a combater o crime, levando a polícia a vencer a batalha contra a indústria do sequestro. Parecia que a Central DD era uma unanimidade, quando Millôr publicou o texto abaixo. Embora não concordemos com seus argumentos, pois denúncia e delação são coisas muito diferentes, foi para nós um momento muito importante de reflexão sobre a nossa atividade e seu valor. 

Nota-se que houve uma modificação após o 11/setembro/2001, mas o recado continuou igual. Leia O Delator, de Millôr Fernandes:

O Delator

A coisa mais odiosa inventada para usar o trôpego caráter humano é a delação. Quando vejo, aqui mesmo no Rio, esse anúncios oficiais de grandes empresas, bancos, ônibus etc, gritando DENUNCIE sinto vergonha por vocês, já que eu, pra sobreviver, resolvi ser sem vergonha (duas palavras, por favor).

Pessoalmente eliminei a possibilidade de aceitar esse nojo psíquico quando, menino, vi o filme O DELATOR, dirigido por John Ford (grande quando dirigia dramas como este ou filmes românticos como Como Era Verde o Meu Vale). Marcou-me para sempre, tanto que lembro do filme hoje, quase sem apoio de informações atuais.

No papel do delator perfeito estava Victor McLaglen, um grosso admirável. Era delator por razões pungentes e sofria o tempo todo as dores da infâmia. McLaglen fez, durante 50 anos, 121 filmes. Ninguém mais se lembra dele. Repito, pros que vivem lutando por notinhas de jornal: assim passa a glória do mundo.

Ser delator, pelo menos teoricamente, ainda é o máximo da degradação humana. Nos grupos mafiosos - perdoa-se tudo menos trair a omertá - e nos grupos marginais de todo o mundo e de toda a história, desde os assaltantes de estrada do sul da Itália, de Nunzio Romanetti, até entre os cabras de Lampião. Delator não tem perdão.

Agora Bush não só justifica, glorifica, e dá prêmio em dinheiro à infâmia. Chegamos à infâmia globalizada. E patriótica.

PS. Perdão, mas no dia 23 de outubro de 2001, em nosso Saite, pesquisamos o que os teleitores preferiam:

1) Entregar Bin Laden a Bush.
2) Entregar Bush a Bin Laden.
3) Apelar para Monica Lewinsky.

Em uma semana responderam 6.431 pessoas (mais do que a qualquer ibope desses que andam por aí dirigindo eleições).
Apenas 2% dos teleitores foram favoráveis a entregar Bin Laden a Bush, 74% votaram por entregar Bush a Bin Laden! Gozadores, 24% dos teleitores acharam que um boquete de Monica Lewinsky pelo menos transferiria a crise internacional para o Supremo americano. 

Texto extraído da sessão do Millôr no portal UOL

domingo, 18 de março de 2012

Histórias do Disque-Denúncia

O Verdadeiro Herói - 2009
(por Mauro Ventura)


Os jornais dão hoje o devido destaque à prisão ontem à noite de Romarinho, suspeito de latrocínio de Evandro, do AfroReggae. Leio que o Serviço Reservado da PM, a P2, comandou a prisão, feita em conjunto com a Polícia Civil.

O comandante da PM destacou a parceria das polícias. Já o comandante da P2 disse que a prisão era "questão de honra" para a PM. Pelo que se lê, foi um trabalho exemplar de investigação da polícia.
Não foi bem assim. Às 10h da manhã de ontem, o Disque-Denúncia (DD) recebeu a informação de quem eram os culpados e onde estava Romarinho. Repassou tudo à polícia, que foi lá e prendeu um dos bandidos.
Só não deu o devido crédito, preferindo capitalizar a prisão. A população lê e pensa: "Finalmente a polícia investigou", sem se dar conta de que ela mesma é que foi a verdadeira detetive do caso.


Tudo bem a polícia alardear a captura, mas seria bom se tivessem dito que o herói da história foi um cidadão anônimo que telefonou para o DD e contou tudo.


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quinta-feira, 15 de março de 2012

Histórias do Disque-Denúncia

O Delegado que Panfletava Cadáveres - 1991
Em abril de 1991, quatro anos antes da criação do Disque-Denúncia, o delegado Paulo Souto (mais tarde subsecretário de Integração Operacional da Secretaria de Segurança) assumiu a delegacia de Comendador Soares, em Nova Iguaçu. Os grupos de extermínio impunham o terror na região. Na delegacia de Paulo Souto, o número de homicídios oscilava entre 20 e 25 ao mês, e já no dia da posse houve três assassinatos. Os crimes ocorriam principalmente em determinados bairros e tinham características semelhantes. 


Um homicídio numa localidade chamada Palhada, porém, viria a mudar a rotina da delegacia. A vítima era um rapaz entre 19 e 20 anos, baleado perto de uma birosca. “Eu cheguei de gravatinha e prancheta e comecei a perguntar se as pessoas o conheciam”, lembra Paulo Souto. “Só descobri que ele era da localidade. E nada mais”. Ainda assim, o delegado insistiu em ficar. Num dado momento, um bêbado irrompeu a cena do crime. “Doutor, todo mundo aqui sabe quem matou”, gritou o bêbado. Fez-se um silêncio de cemitério. E ele recomeçou: “Eu também sei”. À medida que o delegado se aproximava, o bêbado reagiu: “Não adianta nem vir falar comigo porque eu não vou falar. Se eu falar eu vou morrer”. Seguiu-se uma risada constrangida. E ninguém disse mais nada. “Saí dali com inúmeras testemunhas arroladas e a nítida sensação de que estava sendo enganado. Todo mundo sabia quem era o assassino, mas ninguém iria me dizer porque corria risco de vida”, diz o delegado. “No decurso da investigação vim a saber que naquele dia o criminoso estava no bar, misturado às testemunhas”.

Ao regressar à delegacia, Paulo Souto sentia-se de pés e mãos atados. Sabia que precisava das testemunhas para esclarecer o crime e sabia que elas tinham medo de falar. “Foi quando eu resolvi criar um panfleto, chamado panfleto do cadáver. Era um quarto de folha de ofício que dizia o seguinte: ‘Você que presenciou este crime certamente será a próxima vítima. Denuncie por carta ou por telefone ao delegado Paulo Souto. Não precisa se identificar. Denuncie anonimamente’. Abaixo, o telefone da delegacia”, conta. A cada homicídio, 200, 300 panfletos eram distribuídos ao redor da área do crime. Enquanto isso, o delegado freqüentava reuniões de moradores, tentando ganhar a confiança da população. As denúncias não tardaram a chegar. “Aos poucos fomos identificando os matadores pelos bairros e centrando as investigações neles. Durante o ano de 1991 um número grande de criminosos foi preso graças às denúncias anônimas. Depois vim a saber que isso já tinha sido usado muitos anos antes no Canadá”, relembra Paulo Souto.

A precursora experiência do delegado Souto foi uma das bases da implantação do Disque-Denúncia em 1995. 

quarta-feira, 14 de março de 2012

Histórias do Disque-Denúncia

Os Três Sequestros - 1995
Ainda não eram sete horas da manhã quando Marcos Fernando Chiesa chegou ao Colégio São Sebastião, na Estrada do Galeão, 998, Ilha do Governador. Aluno da segunda série do segundo grau, 16 anos, Marcos estava num Fiorino dirigido pelo motorista da família. Era uma quarta-feira, 25 de outubro de 1995. O que se seguiu estaria nas manchetes do dia seguinte. Diante da escola cheia de alunos, o carro foi fechado por um Passat e um Monza, de onde saltaram homens armados de revólveres e pistolas. Aos berros, o grupo rendeu o motorista e voltou-se para o interior do carro. Filho do comerciante José Chiesa, dono de uma próspera rede de churrascarias, Marcos era o verdadeiro alvo da ação. Foi arrancado do Fiorino e obrigado a entrar num dos carros, que disparou em alta velocidade. Desapareceu sem deixar vestígios.

Menos de duas horas depois, do outro lado da cidade, o jovem Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira Filho seguia para o trabalho. Naquele horário, como de costume, o trânsito arrastava-se lentamente pelas ruas de Botafogo. Diante do shopping Rio Off Price (atual Plaza Shopping), na Rua General Severiano, Eduardo, 21 anos, foi surpreendido por oito homens armados de escopetas e metralhadoras. Vestindo coletes da polícia civil, frios e organizados, eles prontamente cercaram sua pick up Mitsubishi. “Perdeu, perdeu”, gritava um dos integrantes do bando. Sem que pudesse reagir, Duda foi levado pelos bandidos. Cinco dias antes, seu pai, o empresário Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, diretor do grupo Ipiranga, havia assumido a presidência da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro.

Os dois episódios caíram como bombas na cúpula da Segurança Pública, que, na véspera, anunciara com entusiasmo a redução nos índices de seqüestro. Mas um terceiro petardo ainda estava para ser lançado. No fim da tarde, a estudante Carolina Dias Leite treinava equitação na Sociedade Hípica Brasileira, na Lagoa. Antes das 18h, ensaiava sua ida para casa, quando foi rendida na porta do clube. Como as vítimas anteriores, Carolina não foi pega ao acaso. Quatro bandidos esperavam pela moça de 18 anos, corpo mignon, filha de Antônio Dias Leite Neto, empresário do ramo de TV a cabo, neta de Antônio Dias Leite Filho, ministro do governo Costa e Silva. “Foi um soco no estômago”, desabafou o então governador Marcello Alencar. Naquela noite, uma névoa de impotência e desânimo cobriu o Rio de Janeiro. Oficialmente, dez pessoas permaneciam em cativeiro. Dos pontos de ônibus às mesas dos restaurantes, o assunto era um só: o Rio parecia refém do crime organizado.

Passadas menos de 24 horas, uma ligação anônima para o Disque-Denúncia mudaria os rumos dessa história. No telefonema – um dos vinte sobre o caso – uma voz dizia que Carolina estava numa casa do conjunto habitacional Santa Maria, em Campo Grande. Por causa da localização, a informação foi transmitida via fax para o Regimento de Polícia Montada Enyr Cony, da Polícia Militar, que fica em Campo Grande. “Disque-Denúncia? Como é isso?”, estranhou o capitão Weber Guttemberg Collyer, hoje tenente-coronel. “A gente nem sabia direito o que era o serviço”. Apesar da desconfiança, o então capitão achou melhor checar a história e seguiu com um pelotão até o conjunto habitacional. “A denúncia era cheia de detalhes, estava tudo lá. Avistamos a casa, cercamos e arrombamos a porta. A menina estava sentada, vendo televisão, tranqüila. Não estava acorrentada nem amordaçada. Perto dela havia um homem cozinhando”, lembra o tenente-coronel. O bandido tinha um revólver 38 apoiado sobre a geladeira, mas não arriscou empunhar a arma. Aliviada, a moça foi conduzida até o regimento, onde pouco depois pousaria um helicóptero providenciado pela família para levá-la até a Divisão Anti-Seqüestro, no Leblon. “Agora está 2 a 1 para eles”, bradou o então chefe da Polícia Civil, Helio Luz. No dia seguinte, Carolina divulgou um bilhete falando sobre o seqüestro. Encerrava o texto comemorando a libertação e dizendo: “Eu gostaria de agradecer a todo mundo envolvido nesse evento todo, especialmente à pessoa desconhecida que entrou em contato com o Disque-Denúncia”.


Enquanto a família de Carolina comemorava, continuava o calvário dos Gouvêa Vieira(1) e dos Chiesa. Uma semana depois dos seqüestros, na tarde de 1º de novembro, o Regimento de Polícia Montada de Campo Grande recebia um novo fax do Disque-Denúncia. O relato número 89.11.95 dizia: “no Caminho do Vai e Vem, em Rio das Pedras, Campo Grande, sobe um morrinho. No início do morrinho existe um portão preto que dá para um sítio. Há muito movimento de carros estranhos no local e também existe uma pessoa seqüestrada no sítio. A polícia esteve no local, só que não entrou nesse sítio”. Comandante do Regimento, o coronel Gilberto Pereira pegou o fax, estranhou o endereço e correu até a mesa, onde agarrou-se a um guia de ruas. Revirou o livro de cima a baixo e nada. Cismado, ele entrou na sala do serviço reservado e reclamou que não conseguia encontrar o local. Foi quando um soldado, que descansava em um canto da sala, interrompeu o coronel. “Meu comandante, o caminho do Vai e Vem não é em Rio das Pedras. É em Rio da Prata. Eu conheço”. Pereira deu a ordem: “Veste paisano e vai lá com o Weber”. Weber era o mesmo policial que, seis dias antes, libertara Carolina do cativeiro. Naquele dia, estava ali por acaso. Deveria estar de folga, como previa a escala do Regimento, mas havia trocado com um colega, que precisava do dia livre. Era fim de tarde quando a equipe chegou ao lugar descrito na denúncia – uma região de sítios, com algumas poucas casas, quase todas de aparência muito simples. “Seguíamos de carro quando deu para perceber uma pessoa no alto do morro. Já achei estranho, mas, para não despertar suspeitas, não parei em frente ao tal sítio. Continuei e dei a volta. O problema é que a viatura que vinha atrás da gente parou assim que viu o sítio, com o portão preto. Aí, não era mais possível perder tempo. Deixamos os carros e entramos correndo. A casa ficava mais ao fundo, numa descida. Uma casa muito humilde”, conta o tenente-coronel Weber.

Os policiais se dividiram. Parte cercou a casa, parte arrombou a porta e entrou. A construção estava vazia, mas havia um único quarto com a porta trancada. Com o tornozelo ainda dolorido por causa de uma entorse, Weber pediu ao colega que metesse o pé na porta. O colega atendeu ao pedido, a porta veio abaixo e logo os policiais se surpreenderam com a cena. O quarto era escuro e úmido. Tinha aproximadamente 9 metros quadrados e um colchão de casal jogado sobre o chão vermelho. Deitado sobre ele, havia um rapaz encapuzado, amordaçado e com braços e pernas amarrados. Ao lado dele, restos de biscoitos e uma garrafa de refrigerante. “Falei para ele que éramos da Polícia. Ele abraçou, chorou, ficou muito emocionado. A gente sentiu que ele tinha sido maltratado”, diz Weber. O refém era Marcos Chiesa. Nos sete dias de calvário, saber-se-ia depois, ele passou por vários cativeiros, foi transportado na mala de um carro, machucou o pé numa das mudanças, dormiu preso a uma árvore numa gruta. Passou frio, sede, fome e pensou que fosse morrer. Libertado pelos policiais, Marcos foi levado ao Regimento de Polícia Montada, onde tomou banho e jantou ao lado da tropa. Depois, foi conduzido à Divisão Anti-Seqüestro, onde o pai e os irmãos esperavam por ele. Naquela noite, diante de um pelotão de repórteres, Marcos agradeceu e fez um apelo à população, pedindo que as pessoas continuassem a ligar para o Disque-Denúncia.


A voz anônima que levou a PM ao cativeiro de Marcos esforçara-se – e muito - para ajudar. Primeiro, ligou para o Disque-Denúncia informando a localização do cativeiro. Depois, acompanhou a movimentação de policiais da Divisão Anti-Seqüestro pela vizinhança. Como eles foram embora sem chegar à casa, o informante ligou novamente para o Disque-denúncia, desta vez com detalhes mais precisos. Durante todo o episódio, um cidadão, anônimo, monitorou, da janela, a ação de bandidos e policiais. E repassou tudo o que viu em suas ligações. Horas depois, ao lado do filho, José Chiesa desabafava aliviado: “Sem a denúncia acho que meu filho não teria sido encontrado”.

Os seqüestros de Marcos, Carolina e Eduardo desencadearam uma onda de indignação que uniu empresários e moradores de favelas, organizações-não-governamentais, políticos, artistas, sindicatos. Um amplo movimento pela paz, batizado de Reage Rio, ganhou as ruas da cidade. Enquanto isso, a central de atendimentos do Disque-Denúncia via o volume de telefonemas crescer 800% em quinze dias. Os seqüestros de outubro de 1995 foram a prova de fogo do Disque-Denúncia. “Foi quando pudemos provar a eficácia do sistema”, afirma Zeca Borges, coordenador do serviço. O combate ao crime no Rio de Janeiro ganhava uma nova arma. E desta vez ela estava nas mãos do cidadão.
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1 Várias denúncias falavam do suposto cativeiro de Eduardo. Nenhuma levou a polícia até ele. O rapaz viria a ser libertado, graças a investigações da Polícia Civil, na madrugada do dia 31 de novembro – mais de um mês depois do seqüestro, em Santa Cruz da Serra, Duque de Caxias. Eduardo estava acorrentado ao empresário José Zeno, seqüestrado quatro meses antes, na porta de sua casa, no Condomínio Novo Leblon, na Barra da Tijuca.

quinta-feira, 8 de março de 2012

DIA INTERNACIONAL DA MULHER E OS EXEMPLOS DE MULHERES CORAGEM


Milton Corrêa da Costa
(Neste 08 de março, Dia Internacional da Mulher, vale conhecer a história de vida da ex- esposa de Guimarães Rosa, a luta da magistrada corregedora do Conselho Nacional de Justiça e o trabalho de uma Major da PM do Rio de Janeiro)

ARACY MOEBIUS DE CARVALHO GUIMARÃES ROSA
Paranaense, nasceu em Rio Negro, e ainda criança foi morar com os pais em São Paulo. Em 1930, Aracy casou com o alemão Johan von Tess, com quem teve o filho Eduardo Carvalho Tess, mas cinco anos depois se separou, indo morar com uma irmã de sua mãe na Alemanha. Por falar quatro línguas (português,inglês, francês e alemão), conseguiu uma nomeação no consulado brasileiro em Hamburgo, onde passou a ser chefe da Secção de Passaportes.
No ano de 1938, entrou em vigor, no Brasil, a CircularSecreta 1.127, que restringia a entrada de judeus no país. Aracy ignorou acircular e continuou preparando vistos para judeus, permitindo sua entrada no Brasil. Como despachava com o cônsul geral, ela colocava os vistos entre a papelada para as assinaturas. Para obter a aprovação dos vistos, Aracy simplesmente deixava de pôr neles a letra J, que identificava quem era judeu.
Nessa época, João Guimarães Rosa era cônsul adjunto. Ele soube do que ela fazia e apoiou sua atitude, com o que Aracy intensificou aquele trabalho, livrando muitos judeus da prisão e da morte.
Aracy permaneceu na Alemanha até 1942, quando o governo brasileiro rompeu relações diplomáticas com aquele país e passou a apoiar os Aliados. Seu retorno ao Brasil, porém, não foi tranquilo. Ela e Guimarães Rosa ficaram quatro meses sob custódia do governo alemão, até serem trocados por diplomatas alemães. Aracy e Guimarães Rosa casaram, então, no México, por não haver ainda, no Brasil, o divórcio. O livro "Grande Sertão: Veredas", de João Guimarães Rosa (1956), foi dedicado a Aracy.
Sua biografia inclui também ajuda a compositores e intelectuais durante o regime militar implantado no Brasil em 1964, entre eles Geraldo Vandré, de cuja tia Aracy era amiga.
Aracy ficou viúva no ano de 1967 e não se casou novamente.Sofria de Mal de Alzheimer e morreu no dia 3 de março de 2011 em São Paulo, de causas naturais, aos 102 anos.
Fonte: Site Brasilianas. Org

ELIANA CALMON
Ao liderar a luta pela devolução ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), conforme recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), do direito de investigar magistrados, independentemente das ações nas corregedoroias estaduais, a ministra Eliana Calmon, corregedora do CNJ, ganhou a admiração de todos os brasileiros paela luta obstinada em favor da transparência no Poder Judiciário. E, mais, para o bem da democracia, processos disciplinares contra juízes serão julgados agora em sessão pública. Uma ato de coragem que marcou a história do fim do corporativismo, indesejável em qualquer dos Poderes da República e em classes prosissionais. Todos, de uma vez por todas, são agora iguais perante a lei. Para o bem da democaracia, o princípio da transparência dos atos públicos, a começar pelo Poder Judiciário, foi restabelecido. A ética, a coragem e o elevado espírito de patriotismo demonstrados pela insigne ministra Eliana Calmon, são exemplos positivos deixados para as novas gerações. Eliana Calmon é uma mulher coragem. O Estado.Democrático de Direito saiu pois vitorioso pela luta obstinada e incansável de uma valorosa mulher. .
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PRICILLA DE OLIVEIRA AZEVEDO
Ela é negra, corpo seco e musculoso, cabelos sempre presosnum coque bem apertado e, de enfeites, apenas gloss e discretos brincos nasorelhas. Tem 1,65 metro e não deve pesar muito mais do que 60 quilos. Não fossepor uma certa dureza, logo notada, a major da Polícia Militar Pricilla, de 34anos, poderia até ser descrita como uma mulher de aparência frágil. Engano.Depois de expulsar o tráfico do Morro Dona Marta, em Botafogo, como primeiracomandante de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) no Rio, ela ligou naterça-feira dos EUA, na hora do almoço, para contar ao secretário de Segurança,José Beltrame, outro feito. Meio sem jeito, disse que era uma das dezvencedoras do Prêmio Internacional Mulheres de Coragem 2012.
— Você é uma guerreira! — explodiu Beltrame ao telefone.
Não era para menos. Em 2008, ele colocara nas mãos de uma oficial da PM, ignorando resquícios machistas, o mais importante programa de segurança do governo.
Beltrame não esconde de ninguém a admiração que tem pela história de Pricilla de Oliveira Azevedo, de origem humilde, parecida com a dos moradores da comunidade que protegeu por três anos. No início, chegou a andar de fuzil pelas vielas. Depois da pacificação, adotou a pistola. Mas a arma da major sempre foi mesmo a conversa. Junto com a repreensão no olhar, era imbatível. Pode parecer politicamente correta, mas, dizem, que se transformava em operações policiais. Com a adrenalina, sobravam até palavrões.
Mulher coragem. O título faz sentido. Em 2007, ela sofreu um sequestro-relâmpago. Foi levada com uma arma enfiada na boca até uma favela em Niterói. Quando a identificaram como policial, ela apanhou. Na cara. E muito.Ficou cheia de hematomas. Mas conseguiu fugir. Catou um por um seus detratores;só falta um. Um dia chega o dia dele.
Estudante de direito, a major — que deixou até afilhados na favela; e quantas Pricillas sem S não nasceram depois de sua passagem por lá? — só saiu do Dona Marta para assumir o desafio de cuidar de todos os projetos estratégicos da pasta.
O prêmio é um luxo para Pricilla, evangélica da Assembleia de Deus, criada no subúrbio. Será entregue nesta quinta-feira, Dia Internacionalda Mulher, pela secretária de estado americana, Hillary Clinton, em Washington.E terá como convidada especial ninguém menos que a primeira-dama Michelle Obama. Pricilla também deverá ser cumprimentada por Leymah Gbowee e Tawakkol Karman, que ganharam o Prêmio Nobel da Paz de 2011. O evento será no Auditório Dean Acheson do Departamento de Estado dos EUA. Em comum entre as premiadas,ações na área de direitos humanos, caso de Samar Badawi, ativista política da Arábia Saudita, ou de Hawa Abdallah Mohammed Salih, do Sudão.
Fonte: Jornal 'O GLOBO'
EXEMPLOS

Aracy, Eliana e Pricilla são, pois, três belos exemplos de mulheres coragem a serem reverenciadas, entre bilhões de mulheres heróis e anônimas no mundo, neste O8 de março. Nossos calorosos aplausos a quem dá a luz da vida e os exemplos de coragem, amor, afeto, doçura e companheirismo. Parabéns mulheres pela lutas e conquistas.
Milton Corrêa ds Costa é coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro

segunda-feira, 5 de março de 2012

As ofensas à magistrada e ao policial

Milton Corrêa da Costa

Dois recentes episódios, de ofensa a uma magistrada e a um policial, ambos encontrando-se no pleno exercício de suas missões, precisam ser objeto de reflexão. No primeiro caso, ocorrido dias atrás, na Zona Oeste, durante uma operação de fiscalização da Lei Seca, um delegado da Polícia Civil, passageiro de um veículo sem placas de identificação, e sem que a nota fiscal de compra tivesse sido apresentada, insurgiu-se, de forma desrespeitosa, a um oficial da PM que ordenara proceder de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro.

Salta aos olhos a reprovável e inaceitável conduta da referida autoridade policial — o episódio foi flagrado em vídeo — ao desacatar o oficial. Um mau exemplo para quem deveria ser o primeiro a zelar pelo cumprimento da lei e sobretudo respeitar agentes da autoridade no exercício legal da função. Ninguém está cima da lei pelo cargo ou função que ocupa. A reação agressiva e deselegante, tentando desacreditar e constranger o policial em via pública, fere o bom comportamento social e ético que se espera de autoridades policiais. Indesejável e reprovável conduta, sem nenhuma dúvida.

O outro episódio, este de claro desrespeito, foi protagonizado pela advogada de defesa de Lindemberg Alves, durante o julgamento de seu cliente, condenado a 98 anos de prisão. A advogada Ana Lúcia Assad, em dado momento do julgamento, disse à juíza do caso: “Você precisa voltar a estudar’’.

A juíza Milena Dias afirmou durante a leitura da exemplar sentença de condenação, que requisitou ao Ministério Público, em sua legítima defesa e a do próprio Poder Judiciário, que apure a declaração dada pela advogada. A juíza considerou que houve crime contra a honra. A frase, segundo ela, foi proferida de “forma jocosa, irônica e desrespeitosa.” Fica aqui, portanto, o ensinamento de que sem respeito à justiça e à polícia não há respeito à lei, à ordem e ao Estado Democrático de Direito.

Milton Corrêa da Costa é coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro

domingo, 4 de março de 2012

ÁLCOOL, MACONHA E DIREÇÃO: UM COQUETEL PERIGOSAMENTE MORTÍFERO

Milton Corrêa da Costa

O motorista de uma picape colidiu contra uma moto e matou um casal na manhã de sábado, 03 de março, na Avenida M’Boi Mirim, na Zona Sul de São Paulo. Será indiciado por homicídio doloso (dolo eventual), segundo informações da polícia que afirma que a perícia encontrou, atrás do banco do passageiro do veículo, um cigarro de maconha. Por volta das 6h30, após fazer uma conversão proibida, próximo ao Terminal Guarapiranga, o veículo atingiu a moto onde estava o casal Alexandre da Silva e Francielle Paiva, que deixaram uma filha de 6 anos. Antes de colidir contra um muro e derrubar um portão, ele ainda atropelou um homem que caminhava pela calçada. O motorista do carro ficou gravemente ferido e ficou internado no Hospital das Clínicas.

Como se não bastassem as tragédias ocorridas no trânsito pelo uso do álcool, tal fato traz novamente à baila a discussão sobre o efeito do uso da maconha (droga ilícita) na condução de um veículo e na vida cotidiana. “É preciso explicar as coisas à luz das últimas pesquisas. Se é verdade que antigamente um cigarro de maconha provocava efeitos equivalentes ao de duas doses de uísque, hoje, com as mutações genéticas produzidas nas sementes da planta para intensificar as sensações que ela provoca, é praticamente impossível determinar os níveis de THC (tetrahidrocanabinol), o princípio ativo da maconha que cada cigarro contém”, pondera a psiquiatra Maria Thereza de Aquino, professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e diretora do NEPAD, Núcleo de Estudos e Pesquisa em Atenção ao Uso de Drogas.

Um dos discursos mais conhecidos daqueles que defendem a legalização da maconha é justamente o de questionar a venda livre de bebidas alcoólicas e de cigarros. Consideram hipocrisia condenar a liberação do consumo da droga ao mesmo tempo em que bebidas e cigarros- que consideram bem mais prejudiciais ao organismo do que a Cannabis sativa- são comercializados livremente em todo o país. Apesar de chamar a atenção para os riscos do álcool e do tabagismo, esse questionamento não tem levado em conta as dificuldades de comparação de produtos tão diferentes. “A maconha não é pior do que o álcool, mas é muito mais prejudicial do que o cigarro”, afirma o psiquiatra de adolescentes Içami Tiba, autor do livro “ A maconha e o jovem”, editado em 1989.

Anos depois, ele não só continua contra a legalização da maconha como pesquisou e descobriu mais um importante argumento para reforçar a sua posição- a existência de três níveis de prejuízo para o usuário. “Há o prejuízo ético, que ninguém costuma levar em conta, em que há uma quebra de valores próprios. Há também, um comprometimento psicológico, já que a maconha provoca uma forte dependência devido à ação do THC. E. por fim, há o aspecto físico, com danos até para os fetos de grávidas que fumam”, diz o médico.

Quando se fuma um baseado, as moléculas de THC vão para o pulmão. De onde caem na corrente sanguínea que distribui a substância para todos os órgãos. As primeiras moléculas chegam em segundos aos neurônios, embora os efeitos da droga só comecem se manifestar em 10 a 15 minutos (obviamente que vão influenciar a condução segura de um veículo). Atuando diretamente sobre o sistema límbico, sede do comportamento, da memória e das emoções, a maconha modifica as sensações, intensificando-as e tornando-as mais agudas. Olhar simplesmente para a parede pode ganhar a dimensão de uma experiência nova, com cores, volumes e texturas jamais sonhados. “É quando se tem ideias que parecem geniais, mas que são esquecidas tão logo se sai do transe da droga. E mesmo lembrando, elas deixam de fazer sentido na medida em que é impossível seguir a linha de raciocínio que se teve sob o efeito da maconha”, explica a Dra Maria Thereza.

Os que já experimentaram o barato da Cannabis conheceram a excitação, a fala arrastada, o riso constante, os olhos avermelhados, o pulso acelerado, a perda de concentração de atenção, e a fome que se sucedem a um baseado. Em cinco anos, porém, a uma média de cinco cigarros semanais, o quadro se torna dramático. A apatia e o marasmo embotam a inteligência e a vida do indivíduo. “È a chamada síndrome amotivacional, um quadro irreversível de total falta de motivação para a vida”, explica a Dra Maria Thereza. Ou seja a maconha antecipa os malefícios que o álcool irá causar em quinze/25 anos nos homens, ou em cinco a dez nas mulheres.

Para a Dra Maria Thereza a maconha pode ser mais bem perigosa do que o álcool, já que a atmosfera permissiva que a cerca pode levar adolescentes a usá-la para enfrentar o que Freud chamou de “dor de existir”.Mas tornar-se ou não um dependente de drogas, mesmo numa fase de mudança e conflitos interiores, como é o período que antecede à juventude, é resultado de uma conjugação de diversos fatores: estar passando por uma situação desfavorável; o encontro com a droga; e a personalidade de cada um. Este último item é fundamental: a psiquiatra avalia que “não existem drogados em famílias felizes, bem-estruturadas emocionalmente e sem problemas se adaptação. Por outro lado, para pessoas imaturas, com propensão à dependência (seja ela dos pais, de comida ou de outros tipos de apoio), a maconha pode servir para abrir a porta do que é proibido.

Ainda assim há os que, ao abrirem a porta do proibido, entram e saem. E há os que entram e ficam. ”Mais uma vez, o que faz a diferença é a estrutura emocional de cada um”, explica Maria Thereza de Aquino. O mesmo raciocínio responde ao argumento frequente usado de que a maconha seria um trampolim para drogas mais fortes. Não é. “Ao contrário da excitação provocada pela cocaína que leva muita gente a recorrer ao álcool para reduzir o pique, e novamente à cocaína para sair da depressão provocada pelo álcool, no caso da maconha é o ambiente à volta que influencia a se experimentar outras drogas novas e sensações”, explica a psiquiatra.

“Mas aqueles que trilham o caminho das drogas passam por ela. É muito comum a garotada acreditar que tem controle total sobre a droga, mantendo a falsa noção de que fuma porque quer e que é capaz de parar quando desejar. Não é realidade. Dificilmente o garoto percebe que está sendo dominado pela droga, que a dependência psicológica provocada pela maconha, é muito mais forte que a física, pois leva o dependente a sentir a necessidade de alteração psicológica”, afirma o Dr Içami Tiba, que em sua opinião o melhor caminho é concluir que a droga venceu o primeiro assalto da luta e que a família- e não só o filho- precisa de ajuda para não perder toda a batalha.

É fácil também concluir que assim como o álcool, maconha (droga ilícita) e direção é desgraça presumível. O uso das duas drogas ao mesmo tempo é mais desgraça presumível ainda mais quando se está ao volante de um carro.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Morro do Preventório - Charitas, Niterói


Em 2011 foram registradas na Central Disque-Denúncia 2500 informações sobre tráfico de drogas em Niterói. Delas, 375 referem-se ao Morro do Preventório, em Charitas. De acordo com 23 destas denúncias, traficantes da Mangueira lá estão refugiados desde sua ocupação, em 16 de julho de 2011 e descrevem sua ação com o apoio dos traficantes locais pertencentes ao Comando Vermelho.

Liderados pelo traficante procurado Danilo Bocão, o grupo composto por Diguinho, Leleco, Tiago, Bill, Playboy, dentre outros, foi responsável pela morte da gestante Thaila de Oliveira Braga dos Santos, moradora da comunidade e acusada de ser informante da polícia. Em razão deste homicídio, ocorrido no mês de julho, Danilo encontra-se foragido da justiça e o Disque-Denúncia oferece recompensa de mil reais para informações que ajudem a polícia a localizá-lo.

Os demais relatos evidenciam o sentimento de medo da comunidade e a constante coação dos moradores, que sofrem diversas ameaças, são expulsos ou têm suas casas invadidas, e são obrigados a conviver em um ambiente dominado pelo crime.

O grupo circula tranquilamente pelo Morro, portando fuzis e metralhadoras. Nos fins de semana, realiza bailes funk com execução de músicas em alto volume que fazem apologia ao sexo e ao tráfico de drogas.

Em 2012 já foram registradas 19 denúncias sobre o tráfico de drogas nesta localidade, em sua maioria alertando as autoridades sobre a ação violenta dos traficantes, que impõem toque de recolher, e conforme relatado, recentemente rasparam o cabelo de alguns moradores suspeitos de serem informantes da polícia.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

2011, o ano em que o tráfico perdeu, playboy

O ano de 2011 na área da segurança local e mundial ficará marcado por duas imagens, mas três podem resumir esse período. Uma é a do traficante Nem (foto acima) vestindo camiseta verde, uniforme de detento da Secretaria estadual de Administração Penitenciária, cabeça raspada e um olhar de indefeso menino de rua. A outra vai demorar décadas para sair dos arquivos da CIA: Osama Bin Laden morto pelas forças especiais americanas, no covil dele, no Paquistão. Terminava uma caçada de dez anos, que mudou drasticamente o conceito de segurança e combate ao terrorismo no mundo todo. Já a prisão de Nem é o retrato de que a polícia pode vencer o narcotráfico e criminosos que eram tidos como invencíveis, entocados nas favelas do Rio. Bastou uma operação de inteligência que não deu um só disparo na ocupação da maior favela do Brasil -- a  Rocinha -- de onde Nem controlava também policiais do 23º BPM e quem sabe da 15ª DP (Gávea). Após a prisão  por policiais do Batalhão de Choque, Nem contou a agentes da Polícia Federal -- para onde fora levado por falta total de confiança na delegacia da área onde foi preso -- que metade de seu lucro ia para a "caixinha" da polícia. A mesma que prometia prendê-lo.
A prisão de Nem teve outra ajuda importante: a sociedade, que por meio do Disque-denúncia (2253-1177) passou a acreditar ainda mais na ação da polícia e deu telefonemas que foram fundamentais para se planejar operações sigilosas contra o tráfico e até as milícias, mais difíceis de serem enfrentadas porque estão infiltradas no aparelho policial e contam com métodos de convencimento da população mais eficientes do que os do tráfico.
A terceira imagem, não menos importante, foi revelada pelas câmeras do tribunal  de Justiça. É a da juíza Patrícia Acioli, deixando pela última vez sua sala, onde ela fazia um trabalho essencial no combate aos criminosos dentro da polícia. Na noite de  11 de agosto, uma quadrilha formada por policiais do 7º BPM (São Gonçalo) executou um plano suicida -- ao estilo da Al Qaeda -- que foi atentar contra a Justiça. Mataram a magistrada que os investigava, mas não mataram a sede de Justiça da sociedade.
O ano de 2011 foi importante para este blog porque o blogueiro teve a chance de deixar um pouco a posição de analista e honrar o nome do site, subindo a Rocinha e a Mangueira, para acompanhar as  operações policiais. Vi coisas extraordinárias. Percebi que os moradores de favelas estão botando fé na política de pacificação, que projetou para o mundo a imagem do secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, como um grande estrategista, apesar de eventuais falhas de seus colaboradores diretos. Foi ano em que caíram dois chefes da cúpula. O primeiro foi o delegado Allan Turnowski, substituído por Martha Rocha, em fevereiro. O outro foi o coronel Mário Sérgio Brito, que cedeu a más companhias, e  foi substituído em outubro pelo coronel Erir Costa Filho.
Para encerrar o ano e virar mais uma página,  aqui vão  as principais notícias de crime e de segurança pública:
Janeiro - Pela primeira vez uma mulher assume o comando da Secretaria Nacional de  Segurança Pública. É Regina Miki.
Fevereiro - A Polícia Federal se firma como corregedoria informal das polícias civil e militar. Prende uma quadrilha formada por policiais que vendiam  armas a bandidos.  A ação respinga no chefe da Polícia Civil, Allan Turnowski, que cai como inocente. No lugar dele assume a delegada Martha Rocha.
Abril - No dia 12, um doente armado de dois revólveres matou 12 alunos da Escola municipal Tasso da Silveira, no que ficou conhecido como o Massacre de Realengo. O atirador se matou e de seu nome felizmente ninguém mais lembra.
Maio - Uma rebelião de bombeiros acaba resultando na invasão do quartel-central e em conflito com policiais do Batalhão de Choque. Os bombeiros só queriam ser ouvidos pela cúpula do governo, mas a briga resultou em uma sucessão de erros, na qual o governador Sérgio Cabral admitiu mais tarde que pegou pesado.
Junho - Numa desastrada operação numa favela na periferia de Nova Iguaçu, PMs matam um menino de dez anos e somem com o corpo. Dias depois Juan foi achado morto e agora falta mandar para a cadeia os policiais.
Agosto - Na noite de 11, dia do advogado, a juíza Patrícia Acioli foi executada covardemente. Graças a um trabalho primoroso de investigação da Delegacia de Homicídios, os assassinos foram presos. Graças à delação de um deles, foi pego também o mentor do crime, o então comandante do 7º BPM, coronel Cláudio, que tinha no cargo todo apoio do então comandante-geral da PM, coronel Mário Sérgio.
 Setembro - No dia 3, o arquiteto é assassinado por motoqueiros em Ipanema. Naquele mês o Exército enfrenta problemas na ocupação do Complexo do Alemão. Cai o comandante-geral da PM, coronel Mário Sérgio, que oficialmente se demitiu depois da prisão do tenente-coronel Cláudio, acusado de ser o mentor da morte da juíza.
Outubro - Assume o comando da PM o coronel Erir Costa Filho, mandando coronéis para reserva e impondo novas normas de conduta aos comandantes de batalhão, como não levar com eles mais do que o subcomandante. Um estudo de economista do IPEA levanta polêmica sobre a redução de homicídios no estado. O secretário de segurança ameça processá-lo, mas chegam a um denominador comum e tudo acaba bem. Depois do entrevero, porém, os números do ISP nunca mais serão os mesmos.
 Novembro - No dia 1º, a ONG Rio de Paz leva a Copacabana a cruz com os números de homicídios, em sua cruzada contra a violência. No dia 6, o cinegrafista Gelson Domingos é morto num confronto entre PM e traficantes na favela de Antares, em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio. No dia 14, as forças de segurança ocupam a Rocinha e retomam o território do tráfico de drogas, sem um disparo sequer.
Dezembro - Acontecem os primeiros assaltos ao comércio da Rocinha, num desafio à ocupação policial. Uma megaoperação da Polícia Civil cerca bicheiros, mas só um é preso. Dias depois os contraventores estão liberados por habeas corpus. O secretário Beltrame diz que a sociedade precisa reagir. O jogador Adriano é suspeito de ter baleado uma moça dentro do carro dele, após saírem de boate na Barra. Dias depois a jovem disse ter sido a autora do disparo, absolvendo o Imperador.

Por Jorge Antônio Barros